Vivendo em Portugal, iracemapolense faz relato da pandemia do novo coronavírus


Publicado em 3 de abril de 2020
Luís Gabriel está fazendo doutorado em Lisboa (Foto: Acervo pessoal)

Luís Gabriel está fazendo doutorado em Lisboa (Foto: Acervo pessoal)

Nesta semana, a Gazeta conversou com o professor Luís Gabriel Provinciatto, de 27 anos, que é de Iracemápolis e está morando em Lisboa.

Ele está em Portugal desde outubro de 2018, onde cumpre parte de um doutorado em Filosofia pela Universidade de Évora. Confira a entrevista.

Como está a situação de Portugal em relação ao coronavírus?

Portugal é um país com pouco mais de 10 milhões de habitantes e Lisboa e Porto são as principais cidades. Em dados de 2 de abril, o país soma mais de 9 mil casos confirmados da covid-19 e mais de 66 mil suspeitos.

Qual a atuação do governo português?

O aumento exponencial de casos suspeitos não tem coincidido com o aumento de casos confirmados. Muito porque o governo e o sistema de saúde adotaram a estratégia de fazer o exame em pacientes com sintomas da doença. Em janeiro, o governo criou um número de emergência para atender quem dissesse estar com sintomas do vírus. Com a ligação, uma equipe médica vai à casa da pessoa e realiza a checagem; caso necessário, faz o exame. Com isso, evitou-se aglomeração em hospitais e postos de atendimento, impactando em um número baixo de mortes. Até o momento, são 209 mortes.

Quais outras medidas destaca?

Em resumo, outras medidas importantes são: suspensão de todas as aulas presenciais em universidades e demais escolas do país; redução do horário de serviço em setores públicos, seguida da adoção do atendimento online e por telefone; bares, restaurantes e lanchonetes estão funcionando desde o começo de março com o serviço de “pegue e leve” ou “delivery”; o transporte público passou a ser gratuito para auxiliar pessoas que dependem ou trabalham em mercados e hospitais; e, por fim, o governo decretou que as pessoas cumpram a quarentena e fiquem em casa.

Vendo o Brasil de fora, como avalia?

A situação no Brasil é particularmente muito preocupante por dois principais motivos: primeiro, o Poder Executivo Federal, responsável por tomar as medidas emergenciais em situações como essa, está se mostrando inábil e, em certa medida, incompetente para gerir a crise na saúde pública. Segundo, porque algumas orientações estão sendo tomadas já em meio à crise, quando, na verdade, deveriam ter sido tomadas antes, no sentido de prevenir o que iria e irá acontecer. Também é inegável que as circunstâncias trarão impactos na economia. Contudo, devemos fazer estourar a bolha mentirosa de que um CNPJ é mais importante que um CPF, ou seja, de que salvar bancos, indústria e comércio é mais importante que salvar pessoas.

Com a experiência de viver fora, avalia que o Brasil está melhor ou pior do que onde está morando?

Essa é uma pergunta difícil de ser respondida, pois são dois países totalmente distintos em muitos aspectos. Por exemplo, Portugal possui um pouco de mais de 10 milhões de habitantes; no Brasil, só a cidade de São Paulo possui mais de 12 milhões. Portugal não possui Sistema Único de Saúde como o Brasil, o que não significa que o SUS, como está hoje, seja melhor que o sistema de saúde português, muito pelo contrário: a qualidade do sistema português de saúde é muito boa e está capacitada para atender à demanda. O tamanho geográfico de Portugal é muito menor que o do Brasil, que tem o tamanho de um continente e, além disso, faz fronteiras com muitos outros países, ao contrário de Portugal, que faz fronteira somente com a Espanha. Do ponto de vista do bem-estar social, a condição de vida em Portugal está acima da brasileira em alguns aspectos, dos quais destaco a segurança pública. Nesses quase dois anos aqui, nunca vi um amigo ou conhecido dizer que foi roubado, o que não quer dizer que não haja roubo. Até há, mas muito pouco.

A pandemia interferiu no projeto de viver fora?

Responder simplesmente “não” é uma mentira de minha parte, pois o cenário mudou completamente nossa rotina aqui em Portugal e, evidentemente, diminuiu o contato presencial com profissionais de minha área. Contudo, como sempre se tratou de uma estadia aqui em Portugal para estudos, minha permanência tem, desde o começo, uma data para acabar. Portanto, a volta ao Brasil sempre esteve prevista.

Gostaria de dizer algo não mencionado nas perguntas?

Gostaria de acrescentar que todos nós devemos nos sentir responsáveis no combate ao vírus. Isso se dá, principalmente, ficando em casa, evitando contato social e cumprindo a quarentena preventiva. Além disso, não podemos deixar de nos manter informados. Por isso, é importante saber usar os recursos que temos para procurar fontes confiáveis de informação. Não podemos acreditar em tudo que recebemos pelo WhatsApp e vemos no Facebook, Instagram e Twitter. Justamente porque segurar um celular e fazer uma “live” é algo que qualquer um pode fazer e isso é feito em muitos lugares, inclusive aí em Iracemápolis, de maneira irresponsável. Devemos ter critérios mínimos para saber ver, ler e ouvir as informações. São passos básicos que devemos cumprir, dos quais o principal é ver se há algum jornalista responsável pelo que está sendo dito ou escrito, pois todo jornalista teve a formação necessária para poder transmitir a informação de maneira competente. Todo jornalista é formado em uma Universidade e eu acredito na Universidade, pois, sem dúvida, faço parte dela, vivendo entranhado nela.

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