Carta para meu pai
Publicado em 17 de junho de 2016
Parece que foi ontem, mas um ano se passou desde que o senhor descansou. É engraçado como os sentimentos vão se transformando e as lágrimas outrora visíveis, agora escorrem por dentro, invisíveis, solitárias, e a única certeza é que a vida nunca mais é igual.
Sabe pai, esses dias eu estava pensando em como seria o mês de junho, afinal seu aniversário de nascimento também é esse mês, o senhor faria 88 anos, mas para minha alegria, o mês começou trazendo tranquilidade e confiança renovada. Agora, uma grande novidade por aqui está sendo o frio intenso… Nossa! Um frio que há anos a gente não sentia que pegou todo mundo de calças curtas tendo que comprar roupa mais grossa. Calor apenas pro lado de alguns políticos que estão vendo o caldeirão ferver pra eles. O senhor nem imagina a bagunça que virou nosso país, tanta sujeira e corrupção.
Muitos chefes de família estão desempregados e parece que vai demorar pra situação melhorar. Agora parece que querem diminuir os investimentos em saúde e educação como maneira de cortar gastos! O senhor acredita nisso? Onde mais se precisa investir nesse momento é na Educação, formar cidadãos críticos e conscientes para melhorar nosso futuro. Eu não conheço nenhum país que cresceu cortando gastos na Educação. Acho que o que eles querem é fazer liquidação… Liquidação do povo, estão nos liquidando aos poucos, enquanto o salário e as mordomias milionárias deles continuam.
E estamos também no início das promoções por aqui. Não é promoção de roupas e produtos não, é promoção de gente. Está crescendo o número de pessoas que estão se vendendo, pior, se vendendo barato, se prestando a fazer cada serviço que deixaria o senhor totalmente careca pai. Quando a gente vê certas coisas como essa, de se vender por um punhadinho de moedas em troca de uma posição ou de um favor, naquele esforço infindável de ser quem não é, a gente se lembra daquela frase que diz que no mundo não há poder que não seja passageiro.
Pai, muitas pessoas, adultos e crianças tem gasto um tempo precioso na frente do computador nas redes sociais, na maioria das vezes se agredindo, fingindo e infelizmente, regredindo. Essas redes têm aproximado sim pessoas distantes, amigos e familiares que tem um caminho para se comunicar estando longe, mas também tem distanciado pessoas próximas. O som das palavras foi substituído pelo som das teclas.
Por fim, o som da saudade é insubstituível. Esses dias ouvi a música “Naquela mesa” de Nelson Gonçalves, o senhor se lembra, né? Ela reflete um pouquinho desse som de saudade e de lágrimas invisíveis. E quem hoje não chora por dentro? Quem, no meio de alguma situação difícil ou num lugar onde não seria bom chorar, não chora lágrimas invisíveis? Quem?
Para terminar pai, estamos todos bem. Vamos vivendo, passando por tudo isso, cada dia aprendendo mais e tentando errar menos até chamarem nossa senha. Porque eu acho que a gente deve ter uma senha, mas não sabemos o número, nem sabemos em que número está a chamada por aí, mas se chamarem a gente vai. Então, qualquer hora apareço por aí e espero abraçar muito o senhor. E se por acaso o senhor se deparar com a minhas bichanas que partiram também, segura elas ai que um dia eu chego.