Dia de festa


Publicado em 29 de abril de 2023

Naquele dia o relógio despertou cedinho na casa da dona Antonia, o galo ainda nem tinha cantado. Era feriado, mas tudo bem. Dia da cidade é festa importante. Rapidinho ela chamou os três filhos pequenos: João, César e Maria. Uma escadinha que a duras penas ela e seu Joaquim criavam e preparavam para a vida. Uma vida que eles sonhavam diferente para os filhos.

– Vamos lá pessoal. Hora de levantar, hoje é dia de festa. Vocês já aprenderam na escola, hoje Iracemápolis faz 42 anos. Tem desfile na praça. Vamos celebrar nossa terra, essa terra fértil onde tudo o que a gente planta nasce. Terra do nosso sustento, do suor do pai de vocês.

Dona Antonia e Seu Joaquim moravam na área rural da pequena cidade. No pequeno sítio plantavam milho, mandioca, verduras e criavam algumas galinhas. Seu Joaquim trabalhava também na cidade, na grande usina de açúcar e álcool que impulsionou o crescimento de Iracemápolis. Lá ele era cortador de cana com muito orgulho, boia-fria para alguns, adubador da terra para ele. Muitos como ele derrubavam ali gotas de suor que molhavam a terra e alimentavam os sonhos de um futuro melhor com o fruto do trabalho.

– João, pega seu informe, não esquece o cartaz que você vai levar. César passe um pente nesse cabelo e vem tomar café se já se vestiu. Maria, cuidado pra não amassar a saia de pregas. Porta-bandeira precisa estar alinhada, minha filha.

Aos poucos cada um foi tomando seu lugar à mesa da casa simples. Gente de roça, de coração puro e amor pela cidade. Era dia de festa e a família da dona Antonia e Seu Joaquim prezavam pela participação das crianças em todos os eventos da escola. Para eles, era Deus no céu e a escola na terra. “Escola é para vocês serem alguém na vida.” – era o que sempre dizia Seu Joaquim. Se havia uma coisa que eles valorizavam muito era a educação dos filhos. Dona Antonia participava fielmente das reuniões de pais, se sentava com as crianças à noite, mesmo cansada da lida do dia, mas fazia questão de olhar os cadernos de cada um dos filhos e auxiliá-los nos deveres de casa, ainda que ela mesma tivesse algumas dificuldades. Dona Antonia não teve oportunidade de estudar muito, foi só até o ensino primário. Seu sonho era ser professora, não pode realizá-lo, mas no coração sabia que de sua casa sairia uma professora que um dia contaria a história da cidade para tantas outras crianças e juntas participariam dessa festa.

A pequena Maria foi a primeira a ficar pronta e ansiosa aguardava os pais na entrada da casa. Ela já sabia o que o dia prometia. Ia estar com seus amigos de escola, ia marchar sorridente ao redor da praça, vibrar ao som das fanfarras e antes de voltar para o sítio brincaria ao redor da fonte e comeria aquele hambúrguer delicioso pra fechar o dia de festa. O som da fanfarra já ecoava na cabeça da menina, a marcha já se fazia presente em seus pés, a saia de pregas começava a balançar…

– Maria! Maria! Seus alunos estão chegando!

Maria se assustou! Estava divagando. Sua mente voltou no tempo de infância e o peito ardeu de saudades. O cheiro da terra na roupa de seu pai voltou à sua mente e o perfume de sua mãe quando a abraçou em sua formatura do Magistério tomou suas narinas. Parecia que eles estavam ali ao seu lado. A pequena Maria cresceu e se tornou professora, se tornou alguém na vida. Olhou ao redor e lá estavam seus alunos se preparando. A porta bandeira tomou seu lugar e aos poucos uma grande faixa de parabéns foi aberta, sessenta e nove anos da cidade querida. A fanfarra começou a tocar e as saias de prega a balançar. Maria disfarçou as lágrimas e com um sorriso no rosto junto com os alunos começou a marchar.

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