Fora de moda

A fila estava grande na padaria, afinal, quase cinco horas da tarde num dia frio e chuvoso, o que mais queremos é tomar um café quentinho e comer pão com manteiga. A mulher que entrou afobada também queria e exclamou em alta voz ao ver a fila:

— Nossa que fila! Vou ter que esperar. O problema é que estacionei o carro quase no meio da rua…

Claro que todo mundo olhou para fora para ver o carro que estava realmente estacionado um pouco longe do meio fio.

Um senhor que já estava pegando o pão, olhou sorridente para a mulher e também em bom som respondeu:

— Não tem problema, não! Hoje em dia não se usa mais fazer as coisas tudo certinho. Tá fora de moda, ou démodé, como dizem os mais finos.

As pessoas na fila, de início, olharam para aquele senhor que aparentava ter uns setenta anos, meio curiosas. Geralmente pessoas mais velhas querem tudo certinho. Depois da curiosidade e de uns minutos de reflexão veio a resignação, ou seja, a aceitação pacífica dos sofrimentos e dores da vida, pois na verdade, estamos aceitando e infelizmente reconhecendo que fazer tudo certo não se usa mais, principalmente quando assistimos nas notícias um dito cujo de terno e gravata dizendo-se humilhado e constrangido ao ver seus brinquedinhos milionários de quatro rodas serem confiscados e expostos para todo o povo brasileiro que sofre cortes de todo lado e vê seu carrinho de supermercado cada dia mais vazio como seu estômago por viver uma vida de trabalho honesto.

Uma vez alguém me falou sobre “vergonha alheia” explicando que a gente pode ficar com vergonha da situação na qual o outro se coloca. Essa é uma situação de vergonha alheia em minha opinião. A gente fica com vergonha por esse dito cujo… Ele deveria virar um cisco e sumir do mapa depois disso. Vergonhoso o que estão fazendo com o povo. Eu espero somente, e acredito que todos nós esperamos, que aquele senhor da padaria esteja errado e que tudo isso que está acontecendo crie uma nova moda, que se use sim fazer o que é correto e se acabe com essa sem-vergonhice e que possamos um dia ouvir que a corrupção está démodé, como dizem os mais finos.