Ipês Amarelos


Publicado em 14 de outubro de 2023

O sol estava nascendo quando Seu Francisco saiu para sua caminhada matinal. Dois quarteirões e ele já estava na longa avenida que corta a cidade quase que ao meio. Antigamente lá era “a pista”, trecho meio escuro e sombrio que ficava entre vegetações. Seu Francisco, quando pequeno, tinha que atravessá-la para ir à escola. Há muitos anos atrás não tinha nada do lado de cima da pista e para estudar a criançada caminhava uns bons dois quilômetros. A família do Seu Francisco foi uma das primeiras a morar daqueles lados. Hoje a cidade cresceu, têm muitas casas, comércios e indústrias por lá. A pista se transformou na principal avenida da cidade e ao ganhar ipês amarelos se tornou também um cartão postal da pequena Iracemápolis, e é lá que Seu Francisco gosta de caminhar, olhar o movimento e observar as pessoas.

Seu Francisco sempre foi muito observador. Ele costuma dizer que observar o próximo nos ensina muito. Era o que ele fazia principalmente nas manhãs de caminhada, manhã como aquela com céu azul profundo de setembro, com as floradas amarelas dos imponentes ipês da avenida.

Com passos firmes, ele chegou próximo ao letreiro IRACEMAPOLIS, “cidade dos lábios de mel”, pensou ele e fazendo a volta continuou a caminhada. Carros e ônibus passavam rápido, pessoas se dirigindo para seus empregos, levando filhos para a escola. Seu Francisco já fez tudo isso. Já contribuiu para o desenvolvimento da cidade e fez sua parte na roda da vida. Agora, aposentado, suas manhãs eram dedicadas às caminhadas e reflexões.

-Bom dia Seu Francisco! – Saudou mais um caminhante das manhãs. Jovem musculoso que prezava pela saúde física. Seu Francisco o via sempre. E sabia “gente de quem ele era”. Assim se fala na cidade pequena. Quando você quer saber quem é alguém é só perguntar “gente de quem? ” E já terá a resposta.

Seu Francisco conhecia muitos caminhantes da avenida. Sabia gente de quem eram eles. Na casa dos setenta anos, nascido e criado em Iracemápolis, ele conhecia muita gente, mas claro que tinha alguns que ele não conhecia.

Nos últimos anos a cidade cresceu, progrediu, trouxe empresas, até internacionais e atraiu muita gente nova para a região. Seu Francisco já encontrou alemão na padaria e chinês no supermercado, mas claro que não se arriscou a puxar conversa, “vai que eu não consiga entender” dizia ele para a esposa quando chegava em casa. E vendo crianças indo para a escola ele pensava o quão bom seria se todas elas pudessem aprender a falar uma língua estrangeira. “Com certeza eles não ficariam como eu, sem entender nada”, pensava ele toda vez que via algum gringo por aí.

Os minutos passavam e os transeuntes iam aumentando. Entre bons-dias e sorrisos cordiais, Seu Francisco exercitava o corpo e alimentava a alma. As folhas amarelas dos ipês balançavam ao vento suave daquele amanhecer. Parecia que também queriam saudá-lo pelo caminho. Com a brisa batendo de leve em seu rosto sentiu-se feliz e desejou o cafezinho quente da esposa que o esperava em casa. Hora de pegar o pão!

Sem pressa, Seu Francisco entrou na padaria. Entre mais bons-dias e pães fresquinhos ele observou se estava todo mundo lá, os clientes diários, os conhecidos da vida que tornavam seu dia mais alegre. Era sempre preocupante quando não via algum conhecido, mas que alegria, naquela manhã estava todo mundo lá, cada um com sua correria, com seus pensamentos e seguindo a vida. Isso é muito bom! Feliz e com o saquinho de pães quentinhos em mãos, Seu Francisco pegou o caminho de volta.

Atravessou a linda avenida dos ipês amarelos que sorriam para ele, seguiu dois quarteirões para cima e foi para casa. Hora do café!

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