Motivos errados
Publicado em 6 de novembro de 2015
A partir de um determinado momento, comecei a me interessar por alguns escritores que, mais tarde, compreendi que eram brilhantes. Entre eles, três franceses que escreviam com foco na condição da existência humana.
O primeiro que gostei foi Albert Camus. Dois dos livros dele, “O Estrangeiro” (1942) e “A Peste” (1947), são daqueles que a gente devora página por página, ansioso em saber o final. Ou seja, valem cada página.
Jean-Paul Sartre é outro. “A Náusea” (1938) e “O Muro” (1939) são livros muito bons e, nesse último, uma coletânea de contos, há um texto chamado “Erostrato” do qual eu gosto bastante. Ele também nos prende desde o primeiro parágrafo, ao dissertar sobre a fraqueza humana e a busca por fama e reconhecimento. Do autor, guardo sua colocação mais importante (como toda frase genial, em poucas palavras, o resumo de tudo): “A existência precede e governa a essência”. Quando se entende o que isso significa, dogmas e preconceitos se revelam risíveis.
E o que dizer de Simone de Beauvoir, sua companheira de toda a vida? A literatura deve a ela “O Segundo Sexo” (1949), sobre a condição da mulher e o modo como ela deve ser tratada na sociedade, igualitário. Aqui, consta uma das citações mais bonitas da autora: “Ninguém nasce mulher, torna-se”.
É uma pena que, retirada do contexto, a frase tenha causado o barulho que causou pelos motivos errados. Ela foi citada no ENEM e sofreu críticas de políticos e religiosos que tentaram entrar na discussão de gênero. Porém, todo mundo que entende o verdadeiro sentido da sentença sabe que não é nada disso. E sente vergonha alheia da posição de extrema direita dos pastores que opinaram, com triste repercussão na mídia e nas redes sociais.