A morte do Quintal
Publicado em 28 de outubro de 2016
A cultura do concreto parece ter decretado o fim do quintal. Falecido ser. Alguém se recorda do que se trata? Os mais velhos com certeza. Fato é que é cada vez menor nas cidades a quantidade de construções civis onde uma faixa de terra ainda sobrevive no interior de uma casa. Fico tentando achar uma explicação. De quem foi a ideia e por quê? Ouço por aí, como argumento principal, de que o quintal tem sumido principalmente por causa do trabalhão que dá, por causa da sujeira. Eu chamo isso de abundância de preguiça.
O quintal era, em tempos não muito distantes, o paraíso das crianças, um lugar fundamental para uma infância feliz. O quintal era o local das mil e uma possibilidades. Geralmente, este recinto era provido de árvores, e, muitas delas frutíferas. Tamanha era a aventura de subir numa jabuticabeira, mangueira, goiabeira e ali mesmo devorar as deliciosas frutas, direto do pé. As flores, coloridas e exuberantes, por lá enfeitavam a vida. Os bem-te-vis, os sanhaços, os joãos de barro, as maritacas por ali passeavam e encantavam. O frescor das sombras das árvores.
No verão era comum ouvir: Mãe, ‘manhêe’, vou ‘no’ quintal brincar na chuva!!! Que maravilhoso era correr sob chuvas torrenciais, pular em poças de água como se estivesse mergulhando no mar. Voltava todo encharcado para tomar aquele banho quente que parecia lavar a alma. A propósito, as crianças ainda brincam na chuva?
Peças fundamentais do quintal eram os ‘protetores da família’, os cachorros. Em grande, senão na imensa maioria tratava-se de vira-latas. Ali residiam, ladravam e guardavam heroicamente, quando possível é claro.
Les Avanchets, Genebra, Suíça. Este é o endereço dos sonhos de qualquer hortelão urbano, de acordo com o fotógrafo e ambientalista francês Yann Arthus-Bertrand. Ele postou em seu site (www.yannarthusbertrand.org) foto da cidade europeia, onde praticamente todas as casas possuem uma horta urbana. Pois é, por aqui, nos quintais, também havia hortas, mas se foram junto com os quintais.
Vou chamar a cultura do concreto de cultura da assepsia. A cultura da limpeza, dos quintais de chão limpinho, sem ‘micróbinho’. Prefiro um pé de criança imundo de terra, isso sim tinha um nome: saúde! Quintal era saúde! Felizes os que ainda os tem! Sem contar a água escoada…